Um suposto jornalista freelancer teve seus textos publicados em diversas revistas renomadas, como WIRED e Business Insider. Contudo, os sites deixaram passar um detalhe: os conteúdos assinados pelo falso jornalista Margaux Blanchard foram gerados por inteligência artificial (IA).
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Os textos abordavam diferentes temas — desde casais que se casavam em plataformas digitais como Minecraft e Roblox, até histórias sobre a rotina de um pai que relatava os impactos do trabalho remoto em sua vida.
As suspeitas sobre o pseudoautor começaram a surgir após Jacob Furedi, editor do site Dispatch, receber uma proposta duvidosa de reportagem enviada por Blanchard.
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Matéria sobre cidade que não existe
Furedi informou ao portal Press Gazette que, no início de agosto, recebeu de Blanchard uma proposta de pauta sobre a cidade de “Gravemont”, supostamente localizada na zona rural do Colorado, nos Estados Unidos.
No texto da proposta, Blanchard afirmava que se tratava de uma cidade mineradora desativada, transformada em um campo de treinamento secreto usado para investigar mortes, envolvendo cientistas, ex-policiais e ex-mineiros.
O falso jornalista ainda destacava ser a pessoa ideal para escrever o conteúdo, alegando ter experiência com histórias do tipo e contatos relevantes para apuração.
Contudo, após realizar algumas buscas, o editor descobriu que a cidade de Gravemont não existe. A descoberta reforçou as suspeitas de que se tratava de um enredo fabricado por ferramentas de IA.
Furedi chegou a perguntar detalhes sobre prazos e valores para a produção da matéria. Blanchard respondeu que precisaria de cinco a sete dias no local e cobraria US$ 670 (cerca de R$ 3,6 mil na cotação atual).
Diante da insistência por provas de que seria um jornalista real, Blanchard deixou de responder.
Texto publicado no WIRED
Após tomar conhecimento do caso, o Press Gazette alertou veículos sobre a autenticidade dos textos assinados por Blanchard. A partir disso, os portais começaram a excluir as matérias do suposto freelancer.
No caso do WIRED, o artigo publicado em 7 de maio tinha o título “They Fell in Love Playing Minecraft. Then the Game Became Their Wedding Venue” (“Eles se apaixonaram jogando Minecraft. Então, o jogo virou o local do casamento deles”, em tradução livre).
O texto mencionava, por exemplo, uma personagem chamada Jessica Hu, descrita como uma “celebrante digital” especializada em casamentos realizados em plataformas como Twitch, Discord e VRChat. No entanto, buscas posteriores não encontraram registros sobre essa pessoa.
Em 21 de agosto, o site publicou uma nota explicando que a sugestão de pauta havia chegado em abril e só após a publicação os especialistas concluíram que o material fora escrito por IA.
“Cometemos erros aqui: esta matéria não passou por um processo adequado de verificação de fatos nem recebeu a edição máxima de um editor sênior. Colaboradores iniciantes da WIRED geralmente devem receber ambos, e os editores devem sempre ter plena confiança de que os escritores são quem dizem ser”, escreveu a revista em comunicado.
O conteúdo escrito por Margaux Blanchard foi removido da plataforma, sendo substituído por uma nota editorial (wired.com).
“Após revisão adicional do artigo ‘Eles se apaixonaram jogando Minecraft. Então, o jogo virou o local do casamento deles’, a equipe editorial da WIRED determinou que o artigo não atendia aos padrões editoriais. Ele foi removido.”

Ensaios no Business Insider
Em abril de 2025, o site Business Insider publicou dois artigos assinados por Blanchard:
- “Remote work has been the best thing for me as a parent but the worst as a person” (“O trabalho remoto foi a melhor coisa para mim como pai, mas a pior como pessoa”);
- “I had my first kid at 45. I’m financially stable and have years of life experience to guide me” (“Tive meu primeiro filho aos 45 anos. Sou financeiramente estável e tenho anos de experiência de vida para me orientar”).
Após contato do Press Gazette, o Business Insider removeu os textos e, assim como o WIRED, publicou notas de correção.
“O ensaio ‘O trabalho remoto foi a melhor coisa para mim como pai, mas a pior como pessoa’ foi removido porque não atendia aos padrões do Business Insider”, informou o portal (businessinsider.com) em relação a um dos textos.
Outras plataformas, como Index on Censorship, Cone Magazine e Naked Politics, também haviam publicado conteúdos atribuídos a Blanchard.

Lista falsa de IA em jornal
Outro episódio de uso indevido de IA ocorreu no jornal Chicago Sun-Times. Em maio de 2025, o periódico publicou uma lista de leituras para o verão, produzida pela empresa terceirizada King Features Syndicate.
No entanto, muitos livros da lista em questão não existem, com títulos e resumos gerados por inteligência artificial.
O texto foi assinado pelo freelancer Marco Buscaglia, que depois reconheceu não ter verificado as informações.
“Estupidamente, e 100% por minha culpa, acabei republicando esta lista que [um programa de IA] divulgou… Normalmente, é algo que eu não faria. Mesmo que eu não esteja escrevendo algo, pelo menos me certifico de que a fonte está correta, que a analisei e que tudo é legítimo. E eu definitivamente falhei nessa tarefa”, disse o jornalista.
A King Features informou que encerrou a colaboração com Buscaglia, já que o uso indevido de IA violava suas políticas editoriais.
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